Sobre comida e afins

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Sempre teve alguns que previam tudo isso há séculos, porém não era fácil aceitar um desconhecido qualquer questionando as atitudes que nos ensinaram desde o berço. Como poderia uma pessoa que nunca sequer compartilhou o pão conosco julgar nosso atos de forma tão precisa - e ainda nos condenar por nossa (in)coerência?


O pior de tudo era o fato deles terem saído do mesmo lugar onde estávamos. Pareciam querer impor suas meias-verdades a todo momento, nos cerceando a liberdade de escolher como nos locomover, como nos relacionarmos, como nos vestirmos e até mesmo como e o que comer. E, ao menor sinal de hesitação de nossa parte, nunca levantavam armas - apenas argumentavam.


"Hipócritas irritantes, demagogos baratos!", gritávamos nós em resposta. Como vocês ousavam acreditar que apenas nas atitudes pequenas e individuais de nosso cotidiano conseguiríamos mudar a catástrofe que ate mesmo os mais cegos entre nós já viam estar a caminho?


Ah não, não nos renderíamos tão fácil! Afinal, a liberdade de escolha sempre nos foi a última cartada. Quando éramos questionados e não tínhamos mais para onde correr; quando nos debatíamos em nossos argumentos muitas vezes falhos e apenas individualistas, sempre podíamos dizer: ME OBRIGUEM.


E com confrontos assim, em todos os lugares, vimos essas pessoas que tanto gostavam de nos questionar irem, aos poucos, emudecendo. Muitos tombaram sozinhos, por desesperança que algo poderia ser mudado. Muitos cuidamos nós mesmos de tombar, pois suas vozes começaram a ser ouvidas demais. E assim, pouco a pouco, apenas o que nossos pais nos ensinaram (e o que nossos avós ensinaram a nossos pais) continuou a ser repercutido.


Olha, não vou dizer que resistir era fácil, pois as vezes eles pareciam ter razão, sabe? E pareciam se orgulhar de toda carga negativa que fazíamos questão de estampar em suas testas. Vou te dar um exemplo: se chamávamos suas mulheres de putas por não seguirem o que considerávamos certo, elas revidavam com marchas onde todas se autodenominavam 'vadias'! Como que nós, cidadãos de bem e defensores dos bons costumes, iríamos concordar com tamanho ultraje?


As vezes parecia ate mesmo birra, sabe? Como quando uma criança insiste em questionar nossas normas, aquela coisa chata e inconveniente que nos faz ter que criar respostas - muitas vezes para justificarmos o injustificável... E não, não importava a desgraça que fosse, sempre tinha um para jogar a culpa para nosso lado. Tipo quando conseguimos diminuir a maioridade penal para 12 anos - eles insistiam que nossa solução era "paliativa", fundamentada numa espécie de "desejo de vingança"... Logo nós, que tanto lutamos para garantir a segurança deles próprios contra eles próprios!


Mas enfim, voltemos ao começo desse relato. Esses subversivos não existem mais, logo agora que nos seriam úteis. Após milênios nessa louca troca de valores, só $obrou quem já tinha - e quem hoje tem, não sabe como fazer para obtermos o 'básico' novamente. Estamos morrendo, meus caros. Comer, beber e respirar já não é mais um direito, como eles tanto diziam, e sim motivo de chacinas.


No fim, nunca vou esquecer o que o último delinquente que conheci me disse, apesar de não ter lhe dado ouvidos à época: "o comilão, que come tudo que é comível, acaba comido pela comida". Ironicamente, hoje lutamos por coisas bestas como fontes puras d'água como antes lutávamos por petróleo, como eles cansaram de nos falar que iria acabar acontecendo.


(Crônica sobre a aula de Jornalismo Ambiental, em 09/04/2015)

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